29/03/2024

AS POLÍTICAS SOCIAIS, AS LUTAS DEFENSIVAS DO WELFARE STATE E A LUTA HISTÓRICA PELA JORNADA DE TRABALHO DE 10 HORAS – CONTRIBUIÇÕES PROBLEMÁTICAS À LUTA PELA EMANCIPAÇÃO DO TRABALHO

 
                                      (versión en español)   
 
Resumo:
 
O objetivo deste texto é trazer ao debate uma análise do avanço efetivo que a luta por direitos sociais e econômicos dos trabalhadores têm trazido à emancipação do trabalho subordinado à relação-capital. Diante das experiências históricas já realizadas de lutas defensivas contra o capital (exemplificadas na Luta pela Jornada de Trabalho de 10 horas e no período do Welfare State), pretendemos analisar qual a natureza destas lutas sociais no âmbito do capitalismo. O que está em foco é se tais lutas sociais podem fazer recuar o capital, forçando-o à restituição crescente de ganhos ao trabalho, juntamente à diminuição gradual de sua margem de lucratividade, até que se alcance a emancipação definitiva do trabalho.
 
Palavras-chaves: emancipação do trabalho, reformismo, socialismo, políticas sociais, luta de classes.
 
I. INTRODUÇÃO
 
Os efeitos da ofensiva neoliberal sobre as políticas sociais, nos últimos anos, não se revelaram apenas na redução dos recursos, na setorialização, na fragmentação, no incentivo ao voluntarismo, na individualização e na transferência da responsabilidade social do Estado para a sociedade no trato das questões sociais. Alcançaram também o próprio ethos do Serviço Social, e suas reflexões teóricas sobre o tema. De alguma maneira, os assistentes sociais tiveram que ocupar os estreitos espaços reservados à aplicação dos escassos recursos sociais, sob os critérios da política neoliberal, correndo o risco da incorporação, ainda que indesejada, de suas prioridades e objetivos, a despeito de toda visão contrária já desenvolvida durante anos no interior do Serviço Social contra a mera instrumentalização das políticas sociais pelo Estado como forma de atenuação da luta de classes.
Se houve momentos, no passado, em que se pôde avançar no sentido da universalização dos direitos sociais, fortalecendo a convicção de que gradativamente se faria retornar aos trabalhadores parte da riqueza social gerada por eles, na forma dos benefícios indiretos assegurados pelas políticas sociais, hoje se trata de resistir à retirada acintosa de antigas conquistas e de se observar o aumento induzido dos desempregados, com evidente impacto no aumento da demanda dos, agora cada vez mais escassos e seletivos, benefícios sociais.
Essa é a tendência dominante no âmbito dos direitos e benefícios sociais, e não há nada que indique, até o momento, que haverá uma reversão sob o governo Lula, uma vez que este continua submetido, sem demonstrar qualquer resistência, às prioridades e critérios da agenda neoliberal, sob a hegemonia do grande capital internacional.
Diante dessa necessária reorientação macroeconômica da acumulação capitalista, como reação à crise estrutural que já se prolonga desde o final dos anos 70, e a conseqüente imobilidade dos trabalhadores em dispor de equivalente resistência contra a ofensiva neoliberal, as antigas discussões sobre as políticas sociais de fato saem do centro das preocupações dos profissionais do Serviço Social. Questões tais como, se as políticas sociais são resultado de concessões ou conquistas[1], se se prestam à institucionalização e à conciliação dos conflitos, se fortalecem a manutenção da ordem social dominante ou se fazem avançar a luta dos trabalhadores, exigem menor atenção, frente o esforço requerido na luta defensiva pela manutenção dos restritos direitos já adquiridos.
No entanto, exatamente como reação ao estreitamento das políticas sociais implementada pelo projeto neoliberal é que devemos aprofundar nossa reflexão teórico-política sobre os desdobramentos históricos das lutas por direitos sociais universais e examinar o significado dos avanços e recuos realizados, escapando da pressão exercida pelo estado de emergência em que as políticas sociais foram colocadas. As condições de vida impostas aos trabalhadores em geral, nos marcos da crise estrutural do capitalismo – crise nunca vista como agora – exige uma reação que vá para além da mera contabilidade de ganhos e perdas de direitos sociais. Recoloca na ordem do dia a própria continuidade da ordem do capital. E nos obrigam a reexaminar os pressupostos teóricos das políticas sociais premidos pela situação presente, como meio de inserir as políticas sociais no cerne das transformações atuais, considerando que se por um lado, lhes trouxe restrições indesejadas, por outro, tornou mais evidente suas limitações, uma vez que, mesmo obtendo-se ganhos parciais em benefício do trabalho, e não importa se em maior ou menor grau, este “permanece, na palavras de Mészáros (1995:540), firmemente acorrentado ao círculo vicioso do sistema do capital” e de suas necessidades de autovalorização, bem como a tudo que isso implica para a satisfação das necessidades sociais.
Nesse sentido, pretendemos abordar duas questões sobre a luta reivindicatória por direitos sociais, e seu desdobramento em políticas sociais como forma de intervenção do Estado. Em primeiro lugar, tendo-se em foco a natureza das conquistas de direitos pelos trabalhadores e as suas implicações na relação capital-trabalho que caracteriza o capitalismo, especialmente a conquista da jornada de trabalho de 10 horas. E em segundo, quais os desdobramentos históricos da estratégia keynesiana e de seu projeto socialdemocrata do Welfare State, cuja essência era a expansão ilimitada de direitos sem confronto com o capital, até que se alcançasse a emancipação do trabalho.
 
II. A Natureza Limitada das Conquistas dos Trabalhadores
 
Longos debates e estudos já foram realizados para esclarecer o real significado dos direitos obtidos pelos trabalhadores no decorrer da história. No âmbito desse debate, três posições se distinguem: uns preferem vê-los como concessões do Estado; outra posição, representada pelo conhecido estudo de Coimbra (1987), considera como única conquista relatada pela “literatura pertinente”, a luta pela jornada de trabalho na Inglaterra no séc. XIX, e outros que pretendem atribuir duplo sentido, ora concessão, ora conquista. Todas elas procuram depurar da relação estabelecida entre o Estado (representando os interesses do capital hegemônico), os trabalhadores, e outros estratos de classe desassistidos se a legislação social decorrente é resultado de uma iniciativa estabilizadora do sistema ou de um desafio à exploração de classe prevalecente e de demonstração de forças da classe trabalhadora.
A análise, a nosso ver, não deveria prender-se à nomeação de um perdedor ou de um ganhador circunstancial em cada disputa entre trabalho e capital, pois não há como privilegiar apenas um dos contendores quando efeitos e conseqüências são desencadeados por uma luta reivindicatória numa dada processualidade histórica. Trabalho (estamos aqui sempre nos referindo a trabalho abstrato) e capital são “intimamente interpenetrantes” (Mészáros,1995:383), e mantém entre si uma relação de reciprocidade dialética, sendo que, o movimento empreendido por um implica em rearrumação do espaço e posição adotada pelo outro. Reciprocidade não quer dizer, no entanto, equilíbrio, mas sim interrelação de forças antagônicas e irreconciliáveis, na qual o capital só pode existir sobre a exploração e apropriação do trabalho excedente gerado pelo trabalho. Não é demais lembrar que capital é “trabalho alheio não-pago” (Marx,1984:165), e só pôde existir, de forma dominante, apenas a partir do momento em que também o trabalho, enquanto mercadoria, se tornou a base da produção de riqueza social através da generalização do trabalho assalariado.
Na sociedade capitalista, a reprodução do capital implica necessariamente na reprodução da força de trabalho (do trabalho assalariado) na medida e lugar necessários à acumulação do capital. Como diz Marx (1984:188), a “reprodução da força de trabalho (...) constitui, de fato, um momento da própria reprodução do capital”. Não há como alterar a natureza de uma relação em que o capital só existe em função da valorização do trabalho não-pago do trabalhador – são pólos antagônicos de uma mesma relação social. A disputa por condições mais favoráveis à reprodução da força de trabalho está sempre limitada à esfera da relação-capital (“capitalistas de um lado, assalariados de outro”) historicamente estabelecida, e à “relação de dependência” em que se encontra a força de trabalho, pois para subsistir tem que se submeter à venda da sua força de trabalho ao capital (“seu próprio produto personificado no capitalista”) (Marx,1984:189). Para se valorizar enquanto mercadoria o trabalho deve servir à produção capitalista; “incessantemente precisa incorporar-se ao capital como meio de valorização”, e, nesse sentido, encontra-se subordinado a ele, “não podendo livrar-se dele”, enquanto o trabalhador permanecer nos limites da produção de mercadorias e da acumulação do capital como forma dominante de reprodução social. Tal limite imposto pela relação de dependência na esfera da produção é expresso no contexto da discussão sobre a distribuição do produto da riqueza social, o que, nos marcos do sistema dominante do capital, significa nada mais que a “luta pela proporção ‘correta’ entre salários e lucros”. (Halloway,1982:31)[2]
Essas determinações causais definem o espaço de reivindicações e conquistas dos trabalhadores, as quais, mantidas a relação de dependência e a forma de valorização do trabalho subordinadas aos interesses da acumulação do capital só podem significar, em circunstâncias históricas favoráveis, movimentação em ambos os lados da relação capital-trabalho quanto à margem negociável da distribuição da riqueza social, podendo, nessas ocasiões, fluir de volta aos trabalhadores “uma parcela maior” de “seu próprio mais-produto (...) sob a forma de meios de pagamento” (Marx,1984:191). Margens de ganho essas que, no entanto, como veremos a seguir, “não superam a relação de dependência e a exploração (...) do assalariado” e “em nada modificam, (...) o caráter básico da produção capitalista”. A ampliação das satisfações dos trabalhadores assalariados “decorrente da acumulação do capital significa, de fato, apenas que o tamanho e o peso da cadeia de ouro, que o próprio trabalhador forjou para si, permitem reduzir seu aperto.”(Marx,1984:188,191)
Devemos, portanto, nos deter é na relação hierárquica constitutiva dessa relação de reciprocidade, do capital sobre o trabalho, e averiguar se a estratégia utilizada pelo trabalho avança na eliminação da subordinação ao capital, ou seja, se nas lutas por direitos acumula forças no sentido da libertação dessa relação de exploração, ou se procura apenas a atenuação das desigualdades da riqueza distribuída entre as classes, a qual encontra seu limite instransponível na própria manutenção da relação-capital sob a apropriação do trabalho não-pago.
A distribuição eqüitativa da riqueza social, se isso fosse possível, esbarraria na relação de exploração do trabalhador pelo não-trabalhador, o capitalista. Pois como vimos, capital é trabalho não-pago apropriado do trabalhador. Na própria fonte da riqueza, na produção material, já se encontra estabelecida a desigualdade de funções estruturais: uns trabalham e outros se apropriam do trabalho alheio. A base da produção cujo resultado é objeto da distribuição encontra-se, então, já comprometida pela natureza da produção capitalista. Mas imaginemos que esse impedimento histórico-social seja abstraído e que, de fato, a distribuição eqüitativa e justa da riqueza social tenha algum sentido em ser reivindicada. Teríamos de chegar ao extremo de se equiparar o preço do trabalho ao preço do produto criado pelo trabalhador, e não restaria “nenhuma mais-valia para o comprador de seu trabalho”, inviabilizando a transformação do trabalho não-pago em capital e, por conseqüência, provocando o desaparecimento da base da produção capitalista e, por suposto, dos capitalistas.(Marx,1984:127) Nesse caso, estaríamos indo para além da relação-capital, não respeitando os imperativos da dependência e da exploração do trabalho pelo capital. Há, portanto, uma contradição essencial e insuperável no conteúdo da igualdade a ser alcançada por políticas sociais redistributivistas que se pretendem emancipatórias, pois se baseiam na permanência da produção e apropriação desiguais.
Não seria oportuno aqui precisar as diversas questões teórico-políticas que estão embutidas nessa discussão das políticas sociais (tais como, conceito de classe trabalhadora, de Estado, de capital e capitalismo, de economia e política, de totalidade, de luta de classes, de direitos, de cidadania, etc), o que nos interessa aqui é resgatar o lugar que a relação capital-trabalho, portanto, uma relação sustentada pela dominação e exploração de classe, reserva às políticas sociais, uma vez que são indissociáveis do modo de produção capitalista e foram concebidas historicamente para intervir não nas causas, de acordo com Netto (1996:28), mas “nas conseqüências, nas refrações, nas seqüelas da ‘questão social’ ”.
As políticas sociais refletem as contradições de um “confronto irreconciliável” entre o capital e o trabalho, por isso pode, em certas circunstâncias históricas, tanto resultar de uma luta penosa, e duradoura das classes subalternas, como ser fruto das, assim denominadas por Netto (1996:29), “antecipações estratégicas” do Estado. Contudo, por se encontrar no interior dessa relação antagônica não tem como atender igualmente aos interesses das classes em confronto, pois o avanço de uma deve impor retrocessos à outra. Vale dizer que não estamos falando de qualquer recuo temporário, ou reversível, de uma das classes, mas daquele que coloque em xeque a classe dominante, e possibilite a acumulação de forças para a eliminação da relação de exploração sofrida pela classe trabalhadora. Não há acordo a ser compartilhado entre o capital e o trabalho que se sustente com base em conquistas que venham comprometer a vitalidade do fluxo reprodutivo do capital, cujo resultado venha impossibilitar o desenvolvimento metabólico da ordem do capital. É o que coloca limites também ao aumento de salários, pois, segundo Marx (1984:192-193), a contrapartida do aumento do preço da força de trabalho é a “diminuição  quantitativa do trabalho não-pago” que o trabalhador fornece ao capitalista, e essa “diminuição nunca pode ir até o ponto em que ela ameace o próprio sistema” ou perturbe o “progresso da acumulação”. Reivindicações e exigências dos trabalhadores “só podem ser atendidas à medida que possam ser acomodadas dentro de tal quadro de orientação” e encontrem-se subordinados “ao imperativo material da lucratividade”, podendo ainda ser, posteriormente, transformadas em vantagens. (Mészáros, 1995:572-573)
 
III. Leis Fabris do século XIX: um avanço à emancipação do trabalho?
 
O fato da aprovação das leis fabris inglesas do séc. XIX (não se trata somente de regulação da jornada de trabalho, contém também “cláusulas sanitárias e educacionais") se constituir numa vitória/conquista dos trabalhadores tão enaltecida pela literatura especializada, se melhor examinada, como faz Marx longamente em O Capital, acaba por transformar-se em estímulo ao desenvolvimento da grande indústria[3], e à conseqüente intensificação do trabalho necessária à extração da mais-valia relativa. O que não quer dizer que não houve ganhos para o trabalho, pois se conseguiu impor alguma resistência, como diz Marx (1983:211), à “feroz voracidade por mais-trabalho”, numa fase de transição da manufatura à grande indústria, “por meio da limitação coercitiva da jornada de trabalho pelo Estado", mesmo sendo "na verdade (...) um Estado que capitalista e Landlord dominam.” (Marx,1983:193)
A regulamentação da jornada em 10 horas diárias de trabalho na Inglaterra, país representativo do avanço da industrialização e da maquinaria, foi resultado de penosas lutas operárias, sendo que as primeiras leis compulsórias regulamentando o trabalho surgiram na metade do século XIV, processo esse que se estendeu até ao século XIX, quando se deu a limitação definitiva da jornada de 10hs em 1848.(Marx,1983:215) A regulamentação das normas do trabalho, que incluía a regulação dos períodos de trabalho, os horários limites e as pausas para refeições e descansos, só pôde ser proclamada pelo Estado depois de séculos de luta de classes, o que no capitalismo maduro assumiu proporções de “uma guerra civil de longa duração, mais ou menos oculta entre a classe capitalista e a classe trabalhadora”, uma vez que o trabalhador tornou-se “incapaz de resistir” individualmente.(Marx,1983:235)
A jornada normal de trabalho, portanto, foi “resultado de uma luta multissecular entre capitalista e trabalhador”, o que levou os trabalhadores, enquanto classe, a “conquistar uma lei estatal, uma barreira social superior[4], que os impeça a si mesmos de venderem a si e à sua descendência, por meio de contrato voluntário com o capital, à noite e à escravidão!”.(Marx,1983:215,238)
 O “capital tem como único impulso vital, o impulso de valorizar-se, (...) de absorver (...) a maior massa possível de mais-trabalho”. (Marx,1983:188-189) Durante os primeiros séculos da luta pela regulamentação do trabalho, o capital, ainda embrionário, utilizava-se da força do Estado para garantir o prolongamento ilimitado da jornada de trabalho, levando o trabalhador à extrema fadiga e até à morte[5]. Em sua fase já madura, por volta do século XIX, também o Estado irá promover uma ação oposta à fase anterior, procurando com a regulamentação das lei fabris inglesas uma redução da jornada de trabalho às 10 horas. Além dos movimentos de resistência e luta empreendidos pela classe trabalhadora, outros fatores são apontados por Marx como favorecedores das leis restritivas a serem impostas. Muitos fabricantes utilizavam a violação das leis anteriores como meio de usufruir de condições mais favoráveis da concorrência no mercado, levando a que muitos outros se aliassem aos trabalhadores na defesa da lei das 10 horas.
 A “sucção desmensurada da força de trabalho” à época colocava em risco a própria reprodução da força de trabalho, pois em muitos setores industriais a degradação da vida do trabalhador começou a comprometer as gerações futuras, como indica um inspetor de fábrica quando se refere aos ceramistas, os quais apresentam uma “geração sucessiva (...) mais raquítica e mais fraca que a anterior”, ou quando se constata que os oficiais padeiros “raramente alcançam o 42º ano de vida”.(Marx,1983:193,197,202)
Com as leis coercitivas da jornada de trabalho pretendia-se evitar que predominasse a prática de fabricantes que preferiam atingir “seu objetivo encurtando a duração da força de trabalho, como um agricultor ganancioso que consegue aumentar o rendimento do solo por meio do saqueio da fertilidade do solo”. E nessa preocupação não havia qualquer caráter humanitário, pois o capital não se importa com o trabalhador e sua família ou com seu bem-estar, mas apenas como sua fonte de produção da mais-valia. Além do mais, o “prolongamento antinatural da jornada de trabalho” estaria provocando o aumento dos custos de “depreciação na reprodução da força de trabalho” com a morte prematura dos trabalhadores. (Marx,1983:212) 
Na fase do capitalismo maduro (século XIX), pôde-se, então, mediante a “feroz voracidade por mais-trabalho”, colocar “finalmente o capital sob os grilhões da regulação legal”.(Marx,1983:196) Mas deve-se ressalvar que o refreamento da exploração do trabalho com a lei das 10 horas previa, de início, apenas proteção para menores e mulheres, e não ao trabalhador masculino adulto, o que já constituía uma grande salvaguarda para a super-exploração de significativa parcela da força de trabalho.
A restrição legal à jornada de trabalho enfrentou grande resistência dos fabricantes nos primeiros momentos de sua implantação, apesar de contar com a aquiescência de outros. Essas atitudes controversas encontravam seu fundamento exatamente na margem da lucratividade diferenciada de cada setor industrial e na possibilidade de uns e de outros de, ou burlar a lei, ou utilizar novos meios de produção que viessem recuperar a produção da mais-valia necessária à acumulação de capital. Muitos fabricantes colocavam-se acima da lei, além de contarem com a recomendação dos juízes (originários da própria classe capitalista) para que os inspetores de fábrica do Estado fizessem “vista grossa à aplicação da lei”.(Marx,1983:226)
Para todos os capitalistas, sendo indiferente os que inicialmente resistiram à restrição às 10 horas de trabalho diário, qualquer alteração na forma de extração de mais-valia, que comprometa sua margem de lucratividade, deve provocar uma reação de igual ou maior grandeza que venha assegurar a continuidade da acumulação ampliada do capital. A diminuição da jornada de trabalho, portanto, deveria ser compensada com ganhos adicionais acionados por outros meios de extração de mais-trabalho. Ao capital restavam inúmeras maneiras de atenuar os efeitos restritivos das leis fabris, a despeito da luta dos trabalhadores levada durante séculos, e fez uso delas das formas mais variadas, ora deixando de reverter os recursos financeiros, materiais e humanos, para sua aplicação compulsória, ora preferindo burlar a lei (como o sistema de turnos), pois ainda que penalizado pelo descumprimento da lei, o saldo do lucro restante ainda prevalecia. Medidas como o rebaixamento dos salários com a redução da jornada de trabalho, a restauração do trabalho noturno, a demissão de parte dos adolescentes e trabalhadores adultos, a alteração dos intervalos das refeições (excluídas da jornada normal de trabalho) e a eliminação do descanso das crianças que trabalhavam à tarde, foram algumas entre muitas soluções criativas utilizadas para se contornar e, até mesmo, fazer crescer a mais-valia apropriada da força de trabalho.
 Ainda assim, as leis fabris foram sendo gradativamente generalizadas para os demais setores produtivos e para outros estratos de trabalhadores, pois a muitos proprietários das indústrias interessava inibir a “ ‘concorrência’ imoral dos falsos irmãos” que insistiam em manter o antigo padrão de exploração da força de trabalho com base no prolongamento da jornada. Chegaram mesmo a realizar uma aliança provisória com os trabalhadores, em defesa da luta pelas 10 horas de trabalho, em troca de um apoio destes à luta pela revogação das leis do trigo, a qual beneficiava os proprietários de terra, e seus aliados conservadores, ao mesmo tempo em que encarecia o preço da força de trabalho. Como Marx (1983:223) mesmo destaca numa nota, logo após a abolição das leis do trigo, os capitalistas reforçaram “ ‘seus ataques ‘ aos trabalhadores” e a suas reivindicações.
Todas essas referências históricas não parecem estar distantes dos embates jurídico-políticos travados pelos trabalhadores, em nosso país, desde o final da ditadura. A Constituição de 1988 está repleta de conquistas e políticas sociais  não regulamentadas, ou esvaziadas em seu objetivo distributivo, pois surgiram no momento em que a ofensiva neoliberal e suas estratégias de recuperação das taxas de lucratividade afetadas pela crise mundial encontravam-se em plena implantação no Brasil. Muitas delas nem mesmo puderam entrar em vigor, e aquelas de caráter universalista implementadas, logo viram seus princípios básicos distributivos substituídos por princípios focalistas e seletivos. O que revela, a despeito das particularidades temporais e nacionais das conquistas sociais, uma linha de continuidade dos primórdios do capitalismo até nossos dias, uma vez que permanece intocada a regência do capital sobre o trabalho.
Se é inegável que as prolongadas lutas de classes “arrancaram” dos capitalistas, e forçaram o Estado, a promulgação das leis que regulamentaram o trabalho nas fábricas, não é menos verdade que junto a esse “progresso”, como afirma Marx (1983:224), os mesmos capitalistas, e seu Estado, asseguravam um “retrocesso compensador” através de outras medidas legislativas ou de alterações no processo e meios de trabalho. O que era ganho de um lado, provocava medidas compensatórias de outro. Diz Marx (1984:34) que, “dentro de certos limites, se ganha em grau de esforço o que se perde em duração”. E o ciclo da acumulação do capital continuava seu fluxo expansivo sem constrangimentos regressivos[6]. E, assim, a referência à primeira conquista da classe trabalhadora ganha sua devida dimensão histórica, na medida em que a “jornada de trabalho legalmente limitada” apenas “esclarece quando termina o tempo que o trabalhador vende e quando começa o tempo que a ele mesmo pertence”, sem que coloque em questão a própria relação-capital e a relação de dependência e subordinação do trabalho diante do capital. Parafraseando Marx (1983:238), “Que grande mudança!”, tendo em vista a luta emancipatória dos trabalhadores.
Diante disso, a polêmica sobre se tal direito social foi conquistado ou concedido pelo Estado perde sua importância, pois o que de fato pesa na relação capital-trabalho é se esses direitos podem fazer recuar a exploração a ponto de eliminar a exploração entre as classes. Ou se cada conquista não provocará apenas um novo patamar de lutas sem ameaças ao poder dominante do capital, servindo muito mais para mistificar a pretensa capacidade progressiva dos ganhos sociais até à emancipação e à igualdade, ou mesmo para desviar os alvos estratégicos da luta dos trabalhadores, por uma "ordem social alternativa", para objetivos que apenas auxiliem uma reprodução consentida da mesma ordem com a conseqüente “revitalização do adversário capitalista.” (Mészáros, 1995:205)
Já à época das primeiras lutas do trabalho contra o capital, Marx (1984:39) alertava para a natureza inexorável da relação capital-trabalho desde lá estabelecida, dizendo que
Não há a menor dúvida de que a tendência do capital, uma vez que o prolongamento da jornada de trabalho lhe é definitivamente vedado por lei, é de ressarcir-se mediante sistemática elevação do grau de intensidade do trabalho e transformar todo aperfeiçoamento da maquinaria num meio de exaurir ainda mais a força de trabalho, o que logo deve levar a novo ponto de reversão, em que será inevitável outra redução das horas de trabalho. (grifo nosso)
          As lutas de classes empreendidas dentro dos limites jurídico-sociais impostos pela relação capital-trabalho, e que, portanto, não ameacem a ordem vigente, e busquem o prévio estabelecimento de consenso entre interesses inconciliáveis, não tem qualquer viabilidade de se firmarem enquanto conquistas emancipatórias do trabalho. As forças políticas do trabalho estarão permanentemente se preparando para uma nova e sempre renovável pauta de reivindicações parciais, nível sempre superado pelas medidas compensatórias[7] do capital, que inevitavelmente irá novamente recair sobre os vitoriosos trabalhadores do momento.
 
IV. A ilusão emancipatória do Welfare State.
 
O fato de Marx se referir à luta pela redução da jornada de trabalho e às outras leis fabris ora como “concessões conquistadas” (1983:220), ora como “conquista arrancada” (1984:23), ora como “primeira concessão penosamente[8] arrancada ao capital” (1984:90) não altera em nada a relação de submissão do trabalho ao capital, na medida em que este acaba por ressarcir-se vantajosamente de cada ganho obtido pelo trabalho, como ele mesmo ressaltou. Numa fase de expansão do capital, ou melhor, do próprio mais-produto do trabalho vivo transformado em capital, afirma Marx (1984:191) a possibilidade de “flui[r] de volta para eles [os trabalhadores] uma parcela maior [do mais-produto] sob a forma de meios de pagamento”, o que, no entanto, não coloca em xeque, de forma alguma, a própria relação de dependência e a exploração do assalariado, ao contrário significa apenas, como já visto, uma redução do aperto da “cadeia de ouro” que o trabalhador forjou para si.
Estamos aqui nos referindo ao modo de reprodução do sistema como um todo, pois mesmo quando em casos singulares os trabalhadores obtenham algum ganho sem perda compensatória para o capital, esta estará sendo paga por algum outro setor produtivo, ou em algum outro lugar do sistema orgânico do capital global, como vimos na relação estabelecida entre centro e periferia pelo Welfare State típico dos paises avançados. De certo modo, quem pagou a conta foram os trabalhadores dos países atrasados, submetidos a uma taxa de exploração, e extração de mais-valia, incomparavelmente maior.
O resultado da política de barganha e negociação da socialdemocracia européia responsável pela consolidação do Welfare State nos países avançados revelou-se desolador diante dos efeitos devastadores da crise estrutural do capital desde o início dos anos 70. O principio que orientava a política social-democrata, segundo Mészáros (1995:665) era “jamais desafiar o funcionamento tranqüilo da relação-capital, aceitando assim a subordinação estrutural permanente do trabalho ao capital.” Ao considerar como suficiente atacar apenas as “contradições parciais” e as “disfunções” do sistema do capital, desarmou os trabalhadores, na medida em que elas, como diz Mészáros (1995:682).
podem ser deslocadas e tornadas difusas – dentro dos limites últimos ou estruturais do sistema – e as forças ou tendências contrárias neutralizadas, assimiladas, anuladas, ou até mesmo transformadas em uma força que ativamente sustenta o sistema em questão. Daqui o problema da acomodação reformista.
E dessa maneira, o que o discurso socialdemocrata prometia – um avanço gradual para o socialismo junto com a economia de mercado – não se realizou, predominando apenas a economia de mercado. As concessões obtidas pelos trabalhadores, e lembremos para os trabalhadores de um restrito número de países enquanto os demais sofriam a mais brutal taxa de exploração do trabalho, segundo Mészáros (1995:791), não alteraram a relação de forças em favor do trabalho, e nem poderiam.
A fragilidade da “acomodação reformista” foi logo demonstrada, no momento em que ao sistema do capital já não mais convinha fazer concessões, nem transformar os ganhos do trabalho em vantagens como sempre fez. Com a crise estrutural consumindo o anterior padrão de acumulação tornou-se necessário adotar uma distribuição mais restritiva dos ganhos de produtividade.
Na mesma medida em que a base material da socialdemocracia foi sustentada pela “expansão global do sistema do capital”, seu fracasso encontra-se vinculado ao fim dessa “fase expansionária”. De acordo com Mészáros (1995:722), “a fase histórica de estratégias defensivas se esgotou.” O derrotado projeto socialdemocrata veio assim se juntar à estratégia neoliberal de enfrentamento da crise estrutural do capital, e seus partidos tornaram-se eficientes “partidos liberais-burgueses”, como nos prova a reeleição de Tony Blair, na Inglaterra. Essa evolução, para Mészáros (1995:790-791), “só poderia surpreender” aqueles “que nutriam (...) grandes ilusões sobre a margem de possíveis ganhos para o trabalho.”
Mas qual o papel e lugar das lutas pelos direitos sociais no capitalismo? O ilusicionismo jurídico da assegurada garantia de efetivação e acumulação das conquistas pelos trabalhadores não deve ser substituído pelo imobilismo ou capitulação diante das dificuldades históricas enfrentadas. Os reveses sofridos pelos trabalhadores só podem ser enfrentados na medida em que se coloque as reivindicações parciais em consonância com a luta por um projeto alternativo de ordem social, em que se possa eliminar a desigualdade social a partir da superação da causalidade que lhe dá origem, qual seja, a apropriação, por apenas alguns, da riqueza social produzida pelo trabalho.
Nessa longa passagem, Mészáros (1995:791-792) equaciona devidamente a inserção da lutas por reivindicações parciais no atual momento histórico. Para ele,
O que decide a questão é a relação entre os objetivos visados pelo trabalho e os parâmetros estruturais da ordem sócio-econômica estabelecida. Neste sentido, quaisquer concessões, obtidas pelo trabalho, compatíveis, e que podem ser contidas pelo sistema do capital orientado-para-a-expansão e dirigido-para-a-acumulação, são justamente por isso impróprias para alterar a postura defensiva e a posição estruturalmente subordinada do antagonista do capital para com seu adversário. Este permanece o caso, independente de quão agudos possam ser os embates e confrontações periódicos -- incluindo até mesmo uma greve geral mais dramática -- pelos quais os ganhos do trabalho ao fim são concedidos pelo capital. As concessões ao trabalho no ´estado de bem-estar´ não debilitaram absolutamente em nada o capital. Totalmente pelo contrário, contribuíram significativamente para a dinâmica expansionista do sistema por um período contínuo de duas décadas e meia após a Segunda Guerra Mundial. Nem tais concessões alteraram a relação de forças em favor do trabalho. Se algo [fizeram], (...) debilitaram a combatividade do trabalho reforçando as mistificações do reformismo. Naturalmente, tudo isso não significa que não valha à pena defender os ganhos defensivos do passado, especialmente quando o capital é forçado a tentar revogá-los sob a pressão de uma crise estrutural que se aprofunda. Mas significa que as ilusões associadas a elas ao longo da história da social democracia reformista devem ser expostas pelo o que são, em vez de se fantasiar sobre a viabilidade da ´alternativa econômica estratégica´ neo-Keynesiana do trabalho, a qual, não apenas é totalmente irreal nas circunstâncias da crise estrutural do capital, mas até mesmo, se por algum milagre pudesse ser implementada, não constituiria absolutamente uma alternativa.
Quando se aceita como perene o sistema do capital, cuja condição de existência é a separação dos produtores do resultado e dos meios de trabalho, a ser apropriado por quem nada produz, é inócua qualquer tentativa de reorientação, seja neo-contratualista ou pós-keynesiana, da luta por políticas sociais mais justas e redistributivistas. Como também, não se trata de aperfeiçoar os instrumentos políticos utilizados em cada confronto com o capital na esperança de dele obter-se concessões mais duradouras. Não se trata, portanto, de reformar a crença reformista de que através de conquistas graduais se poderia chegar à liberdade e à igualdade. Ao contrário, a necessidade de se empreender permanentemente também esses confrontos por reivindicações parciais só ganha efetividade histórica se for parte de uma estratégia de superação do próprio capital e da exploração do trabalho. Nesse sentido, para concluir, concordamos com Mészáros (1995:793) quando diz que
 A rearticulação do movimento socialista como uma ofensiva estratégica para se ir além do capital é (...) também uma condição prévia necessária para que sucessos parciais, no tempo devido, dentro da estrutura da estratégia correta, possam se tornar cumulativos. Em contraste, sem a finalidade apropriada da ofensiva estratégica -- orientada para a ordem socialista como uma alternativa hegemônica ao existente -- o próprio percurso estará sem orientação. E nós certamente não podemos dispor do luxo de vagar por um outro século e meio no beco sem saída de tentar produzir mudanças estruturais dentro dos confins estruturais paralisantes do sistema do capital.
Reconhecer as implicações deste “beco sem saída” para a ação profissional é fundamental para o Serviço Social, pois ao reconhecer o lugar que as políticas sociais ocupam dentro da relação capital-trabalho e a necessidade de operá-las, tendo em vista uma “alternativa hegemônica” à ordem do capital, pode-se melhor explorar seus espaços, evitando absorver para si a “enorme frustração entre os profissionais”, conforme nos adverte Behring (2000:179), diante do “baixo impacto” das políticas sociais, e de uma demanda crescente cada vez mais impossibilitada de ser atendida.
 
Abstract
 
The goal of this text is to bring to the debate an analysis of the effective progress that the struggle for workers´ social and economical rights has been bringing to the emancipation of labour under capital. From the late historical experiences of defensive struggle against capital (exemplified in the struggle for the 10 hours-day work and, also,  in the Welfare State period), we intended to search the nature of these social confronts. What we look for is if these struggles are able to force a crescent capital’s retreat, forcing upon it a growing restitution of wealth to labour, along with the gradual decrease of its profity margin, until it is reached the definitive emancipation of labour.
 
Keywords: labour’s emancipation, reformism, socialism, social politics, class struggles.
 
Bibliografia
Behring, E. “La nueva condición de la política social”. In: Montaño,C.e BORGIANNI,E.(orgs.). La Política Social Hoy. São Paulo: Cortez Editora, 2000.
Coimbra, M.A. ”Será que o marxismo responde à pergunta de como surgem as políticas sociais?” In Política Social e Combate à Pobreza. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987.
HOLLOWAY, J. Fundamentos Teóricos para una Crítica Marxista de la Administración Pública. México: Ediciones Instituto Nacional de Administración Pública.
MARX, K. Das Kapital – Buch I. Berlin: Dietz Verlag Berlin, 1975.
MARX, K. O Capital - Vol.I, Tomo 1. São Paulo: Abril Cultural, 1983.
MARX, K. O Capital - Vol.I, Tomo 2. São Paulo: Abril Cultural, 1984.
MÉSZÁROS, I. Beyond Capital. London: The Merlin Press, 1995.
Montaño, C. e BORGIANNI,B.( (orgs.) La Política Social Hoy São Paulo:Cortez Editora, 2000.
NETTO, J.P. Capitalismo Monopolista e Serviço Social. São Paulo: Cortez Editora,1996.
Pastorini, A. “Quién mueve lo hilos de las políticas sociales? Avances y límites en la categoría ‘concesión-conquista’ “. In: Montaño,C.e BORGIANNI,E.( (orgs.)  La Política Social Hoy. São Paulo: Cortez Editora, 2000.


[1] Sobre a discussão dos avanços e limites das Políticas Sociais no capitalismo ver Montaño e Borgianni (2000), e, especialmente, sobre “a categoria ‘concessão-conquista’ “, ver Pastorini (2000).
[2] A relação antagônica de exploração fica subsumida à simples distribuição do produto social entre classes distintas, cujos interesses foram estabelecidos “mediante um contrato justo entre partes contratuais iguais”. Nesse sentido, para Halloway (1982:31), “a relação de classe aparece como uma relação de distribuição (...). Do lado político da repartição, o conceito de cidadão oculta ainda mais a divisão fundamental da sociedade em duas classes antagônicas.”
[3] Com a crescente revolta dos trabalhadores contra a extensão da jornada de trabalho, o Estado foi obrigado “a reduzir à força a jornada de trabalho”. “(...) a partir desse instante, portanto, em que se impossibilitou de uma vez por todas a produção crescente de mais-valia mediante o prolongamento da jornada de trabalho, o capital lançou-se com força total e plena consciência à produção de mais-valia relativa por meio do desenvolvimento acelerado do sistema de máquinas.” (Marx, 1984:33) Assim, aumentou-se o “quantum de trabalho” e provocou-se maior “condensação do trabalho”. Ver também Marx (1984:35).
[4] Na tradução de O Capital utilizada por nós o termo em alemão “übermächtiges” (1975:320) que significa “superior”, “prepotente”, foi traduzido como “intransponível”, o que atribui um sentido totalmente diverso ao texto de Marx. Leva ao entendimento de que as restrições impostas pela força da lei são “intransponíveis”, o que é contradito pelo próprio Marx no decorrer da análise que faz sobre as dificuldades da implantação legal da jornada de 10 horas desenvolvida no O Capital, capítulo XIII – vol. I, tomo 1.
[5] Não são poucos os casos citado por Marx no O Capital, cujos impressionantes relatos são extraídos dos relatórios dos inspetores de fábrica nomeados pelo próprio Estado, o qual assegurava politicamente o extremado grau de exploração da força de trabalho.(Ver Marx,1983:202-204)
[6] Ver Marx (1984:38). Em outra passagem de O Capital vemos que o receio dos capitalistas com a generalização das leis fabris não se concretizou, ao contrário, no caso das cerâmicas não houve aumento dos custos, cresceu a massa de produtos, não houve paralização da produção, mas como diz um representante dos industriais “De fato produzimos mais no mesmo tempo”.(Marx,1984:82-83)
[7] “o capital, assim que fica sujeito ao controle do Estado apenas em alguns pontos da periferia social, se ressarce tanto mais desmesuradamente nos outros pontos (...).” (Marx,1984:91)(grifo nosso)
[8] No original alemão (Marx,1975:512) a tradução mais apropriada de “dem Kapital notdűrftig abgerungene Konzession”” é “insuficiente concessão arrancada ao capital” (grifo nosso). Atenção para a significativa inflexão no sentido dada pelo termo “insuficiente”, o que nos parece mais fiel ao texto de Marx.

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